Música Popular Brasileira

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sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Brava Gente Brasileira, tudo bem?

Devido à nossa extraordinária performance em Johannesburg a companhia aérea TAM, que está inaugurando um vôo direto Rio - Frankfurt, contratou o trio Atazanando Beckenbauer para tocar no evento inauguratório, que será no próximo dia 30, em Frankfurt.

Trocando em miúdos, fomos contratados para atazanar Beckebauer pessoalmente.

Em breve mando notícias da histórica batalha a ser travada.

Grande abraço

Wilson Nunes.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

REFLEXÃO

Brava Gente Brasileira, tudo bem?

Várias pessoas têm respondido meus e.mails falando bem das crônicas, alguns até afirmando que eu deveria ser escritor.
Não sei se considero isso um elogio ou um incentivo para que abandone a música enquanto é tempo...
Grande abraço a todos e até breve.
Wilson.

domingo, 11 de julho de 2010

AFINAL A FINAL

Brava Gente Brasileira, tudo bem?

Hoje falarei sobre futebol.

Tentei fugir do tema, mas acabei sucumbindo.

Já temos uma final. Espanha X Holanda, o que é um sintoma inequívoco de que esse torneiozinho medíocre está chegando ao fim.

Já fui um apaixonado por esse esporte. Desses de ler tudo que os jornais publicavam a respeito. De não perder jogos, ao vivo ou no radinho de pilha. De religiosamente comprar e devorar a ‘Revista do Esporte’. De saber de cor a escalação do Ferroviária de Araraquara, por aí. E de, principalmente, amar o Fluminense Football Club, tal e qual meu pai me ensinou.

Hoje, e digo isso sem nenhuma satisfação, pouco resta desse sentimento. Parece que alguma coisa mudou muito. Ou no futebol, ou em mim. Provavelmente nos dois.

O problema maior que me leva a tamanho descaso não é propriamente o tipo de futebol que hoje se pratica, mas o que ocorre, o tempo todo, fora das quatro linhas. Os fatores extra campo determinam hoje de tal forma o que acontece dentro dele que, para mim, a coisa vem perdendo a graça, se é que ainda tem alguma. Virou meramente um grande negócio. E dos péssimos.

Bons investimentos costumam gerar benefícios. Não é o caso. Trata-se de negócio dos mais capengas. Quase sempre realizado por uma corja mal intencionada de incompetentes que, se aproveitando da imensa energia que ainda emana de nossas paixões, vão manipulando-as sem o menor escrúpulo, enquanto enchem os bolsos de dinheiro, mesmo que para isso sejam sacrificados os clubes que fingem dirigir.

A rapaziada perdeu a noção. Quem conhece um pouco dos bastidores de nosso futebol vive se surpreendendo com o vale tudo instaurado. Literalmente, ninguém está nem aí.

Outro dia, assistindo um Fla X Flu, um dos 45 que costumam ocorrer por ano hoje em dia, olhando o dois times me veio a idéia de que, daqui há um ano, todos os jogadores de um time poderiam estar no outro, sem problema algum. No caso, por qual dos dois que eu deveria passar a torcer? Por tradição, para o da camisa verde, branca e grená, ou para os jogadores que me habituei a admirar e estarão todos no outro time? O desvinculo entre atleta e clube é total.

Ao contrário de meu pai, eu não sei o que dizer aos meus filhos. Não encontro nenhum argumento razoável para seduzi-los a torcer pelo Flu, nem por time nenhum.

Me lembro do saudoso Carlos Castilho, talvez o maior goleiro que já tenha passado pelo tricolor que, no auge da carreira, esmagou o dedo mindinho da mão esquerda. Ao saber pelo médico do clube que a recuperação implicaria em quase 6 meses sem poder jogar e ter do mesmo a afirmação de que cortando a ponta do dedo ela seria muito mais rápida, optou pelo corte, jogando por isso, pelo resto de sua longa carreira, de luvas. É claro que isso é uma atitude extrema. Não considero que todo atleta tenha a obrigação de agir desse modo, mas o caso dá uma dimensão do que representava para um jogador atuar por um grande clube de futebol. Nos dias atuais algo do gênero seria impensável.

Ninguém que jogue em algum clube o faz por devoção ou, pelo menos, afinidade. Está ali por mera oportunidade. E, provavelmente, o que mais quer é ser vendido rápido para ganhar sua parte na negociata. Hoje é impossível imaginarmos em nossos times um Castilho, um Zico, um Roberto Dinamite, exemplos de jogadores que se dedicaram de corpo e alma aos seus clubes, numa época em que os salários nem longe se pareciam com os atuais.

Hoje um bom jogador de um grande time, se não for dos especiais, selecionáveis, ganha em torno de 100 a 200 mil Reais por mês e tem uma vida extremamente ocupada. É muita boate pra dançar, muito whisky pra beber, muita cocaína pra cheirar, muita BMW pra pilotar, muita entrevista pra dar, muito show de pagode pra prestigiar. São muitos puxa sacos para o adular e tirar casquinha, muitas moças generosas querendo participar do seu harém, isso quando não tem que, vez por outra, enterrar alguma no quintal da própria casa.

Como se vê, quase não sobra tempo ao craque para se dedicar e ser um atleta de ponta, que é o que se espera de jogador de futebol de grande time.

E se ele for dos especiais, dos selecionáveis, aí a coisa complica muito. Aumenta de forma monstruosa. Esses têm absoluta certeza de que podem tudo. Ganham, em média, entre 500 mil Reais e 1 milhão de Dólares por mês e consideram que não têm nenhuma responsabilidade sobre coisa alguma, quanto mais em relação aos clubes que também fingem defender.

Vivem fora de forma. Faltam aos treinos. Jogam quando querem. Conseguem perder a cabeça e serem expulsos aos 10 minutos do 1º tempo, deixando o clube que tanto neles aposta 2 jogos sem suas participações, e tudo bem. Nada os abala. Nem ninguém diz nada. É isso mesmo, e pronto.

Há tempos vi, na TV, um especial do tipo “Ricos e Famosos” sobre o craque inglês David Beckham. O apresentador, acostumado com super astros de Hollywood, estava espantado. A vida que Beckham e sua esposa levavam superava em muito a de qualquer um deles. Em glamour, ostentação, compromissos etc. O cara todo dia tinha que ir ao seu escritório, cuidar de seus muitos interesses, elaborar novos produtos para suas marcas, viajar a todo instante para diversas partes do mundo para inaugurar ou participar de eventos sem nenhuma relação com futebol. Fora as 3 festas por semana que, em média, dava em sua mansão em Madri, e que eram as maiores que a cidade já viu. Isso no momento em que era contratado do Real Madri e ganhava o maior salário do futebol mundial. Teria ele condições de ser o atleta que o clube, pelo menos em tese, desejava? É claro que não.

A vida de quase todos os craques do futebol atual não é muito diferente. E tudo isso com a compreensão e até incentivo de dirigentes e empresários, seus verdadeiros “patrões”, que parecem achar tudo muito natural. Evidente é que tal situação só é possível porque todos estão ganhando, direta ou indiretamente, com a situação. No Brasil, então... Qual imbecil que, por força de influência, amizade, trabalhe na diretoria de um grande clube, tentará enquadrar um superstar desses? Sem chance. Na maioria das vezes o bom dinheiro que esses “diretores” imerecidamente embolsam todos os meses tem alguma coisa a ver com certas condições obscuras nos contratos dos craques. São uns “manés”, que não conseguiriam emprego em lugar nenhum. Vão reclamar de quê? Acham tudo muito razoável, claro...

Que profissional, em qualquer ramo de atividade humana, ganha um salário desses e não tem responsabilidades correspondentes? Um bom executivo, para ganhar muito menos que isso, tem que ter uma formação acadêmica de primeiríssima, enorme experiência, se reciclar continuamente, trabalhar 18 horas por dia, debaixo de um stress terrível, e não tem direito a ter faniquito, não. Muito pelo contrário. Dele se espera que, se o mundo acabar, ele saiba que providências tomar.

Jogadores podem agir irresponsavelmente e tudo bem. Dirigentes podem enriquecer armando falcatruas que vão arruinar seus clubes e tudo bem. E nós, torcedores? Temos mesmo que torcer por eles? Devemos fingir que não estamos vendo nada e continuar apoiando essa patifaria? Temos que, com nossa complacência, avalizar os Eurico Miranda, os Cléber Leite, os Horcades etc, etc? Por quê? É só dinheiro transitando pra lá e pra cá, numa lavagem sem fim do mesmo. E os “diretores”, meros testas de ferro encobrindo sabe-se lá o que.

Esse tipo de situação, com certeza, não faz parte do conjunto de atitudes compatível com o advento desse Novo Mundo que, hoje em dia, vivemos apregoando como necessário para a continuidade de nossa vida planetária. Quem não está nem aí para a renovação de valores que os novos Ciclos Civilizatórios impõem, tende a apodrecer e morrer junto com o que se fecha. Um Ciclo desses não acaba em 15 minutos, que coisa tão longamente impregnada não pode ser mudada assim. Mas tende a desaparecer. Assim como foi com o Império Romano, com o Egípcio, com a URSS e tantas invenções humanas “poderosas”, aparentemente inexpugnáveis. O mundo todo está sendo passado a limpo. E a receita do futebol está furada. É muita grana sendo aplicada para espetáculos tão pálidos, sem graça. Ninguém ousa mais dizer o que realmente está em jogo, quais os verdadeiros objetivos dessa maluquice toda.

Ou o futebol muda, se adaptando aos valores dos novos tempos que já se fazem manifestados, ou vai sucumbir, com tudo mais que, por incompreensão dessa realidade, está ruindo. Domingo tem Espanha X Holanda. Inédita final. Melancólica mensagem às pretensões de arrogantes como Dunga, Maradona e tantos outros. Com a participação especialíssima da Jabulani, a bola que tantos transtornos causou. Nunca tantos chutes certeiros se desviaram a 5 metros do gol. Nunca tantos efeitos dados à bola num sentido tomaram rumos tão contrários. Nunca tantos chutes despretensiosos foram acabar dentro das redes. Nunca tantos goleiros de qualidade tomaram frangos tão constrangedores. Ela é um desconcerto só.

Acredito que Jabulani, em Zulu, deve significar “Deus tá vendo”, algo do gênero. Agora é esperar o resultado. Vamos ver quem ganha essa parada. Espanha ou Holanda. Quem perde eu sei bem. Todo aquele que continua sem ter olhos de ver.

Grande abraço a todos.
Que Deus continue gostando de nós.

Johannesburg, 8 de Julho de 2010.

Wilson Nunes.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

O CHURRASCO

Brava Gente Brasileira, tudo bem?

Relatarei, hoje, página das mais impressionantes que tivemos a oportunidade de vivenciar na África do Sul. Nossa reunião no Domingo, 4 de Julho.

Terminada essa bobajada de seleção brasileira, resolvemos fazer um churrasco em honra ao Botequim do Rio que, dentro do que se propôs, deu de 10 X 0 naquele timeco sem vergonha. Nada mais justa que tal comemoração. Combinamos que seria na casa do casal Peter e Ana. Ele, inglês, agente da aduaneira local. Ela, brasileira e nossa referência em Johannesburg. Resolve qualquer parada. Com carne e bebidas já compradas de véspera, o Atazanando Beckenbauer agregou-se às galeras da Riotur, da Turisrio e do Rio Convention aqui presentes e juntos zarpamos para a bela residência do citado casal, que nos recebeu já de copo em punho, pra não deixar dúvidas sobre o teor do evento. Alguns ótimos petiscos, whiskies e cervejas pareciam garantir que tudo caminharia na mais absoluta paz e harmonia. Amenidades sobre nosso dia a dia e galhofas sobre a seleção brasileira e a argentina eram o máximo a que nos permitíamos. Foi quando um acontecimento mágico, surpreendente, começou a ameaçar nossa estabilidade.

Quase que do nada, como uma aparição, surgiu Katherine, uma amiga da Ana que veio como convidada dela, se prontificando a ajudá-la com o churrasco. A visão daquela manifestação quase humana de um metro e oitenta, uns 28 anos, pele de porcelana, cabelo ruivo pela cintura, sorriso de escudo protetor colgate e dois potentes faróis de milha azuis simulando olhos, flutuando pela casa, atordoou os indefesos celibatários-por-força-das-circunstâncias ali presentes. Todos resolveram, compulsiva e simultaneamente, ajudar a ajudá-la. O tumulto já se fazia quando, face ao desastre que se anunciava, começamos a criar senhas e distribuí-las. Algo do tipo eu ajudo ela na caipirinha, você vai na farofa, por aí. Ana deu uma gargalhada, me olhou e disse: “coitada da Katherine”! Retruquei: “Ô”! Foi quando começou o churrasco, propriamente dito. Nosso valoroso Diogo Rosa, também conhecido como Diogo Santa Clara, o Rei do Cavaco Rachado, se prontificou a assar a carne, o que fez com competência ímpar. A carne (que aqui é maravilhosa) começou a sair e a paz, pelo menos momentaneamente, foi reativada. De saco cheio de tanto frio, resolvemos que estava fazendo calor. Tiramos os casacos, arregaçamos as mangas, etc. É bem verdade que o Peter providenciou uma boa fogueira, o que contribuiu sobremaneira para que usufruíssemos dessa inesquecível tarde acalorada em Johannesburg.

Na sequência, depois de muitas cervejas e elogios às tantas prendas de Katherine (vocês não fazem idéia de como ela é boa na farofa, botando cerveja em copo, então, nem se fala), começou o samba. Negão da Serrinha, nosso percussionista, que comprou aqui um tambor africano espetacular, tirou-o da embalagem e deu início à batucada.
O churrasco já estava encaminhado, o que deu oportunidade para que Diogo sacasse seu destemido cavaco rachado. Catei um bongô abandonado e estava instaurado um pagode da melhor qualidade, numa laje qualquer de Johannesburg. Todos cantavam animadamente. Discursos emocionados. Uma felicidade só. A noite caiu, e para esquecermos o frio que teimava em nos lembrar nossa distância do Rio, continuamos a beber, beber, beber... De repente, Peter apareceu com tequila, a marvada. Danou-se. The cow went to the swamp.

A estabilidade, que a essa altura já se mostrava cambaleante, desabou de vez. Nosso valoroso churrasqueiro-cavaquinista Diogo, que de agora em diante será alcunhado como Didi Tequila, tomou umas 5, uma atrás da outra. Em poucos minutos pulava e urrava alucinado pelo quintal e, a todo momento, mandava o Negão, que ainda tentava dar alguma dignidade ao samba, pra tudo quanto é lugar que se possa imaginar, e para alguns que nem se deve. Foi quando, não satisfeito com a performance já mencionada, Didi resolveu cantar a Ana, nossa amiga e mulher do policial federal daqui. Começava a se configurar um sério incidente diplomático quando fomos surpreendidos por uma nova aparição, dessa vez, providencial. Uma van surgiu no portão e nosso comandante Paulo Senise começou a encaminhar a brancaleônica trupe para ela. Negão perguntou: “aconteceu alguma coisa, Paulo?” “Ainda não”, respondeu ele.

A despedida foi das mais comoventes e Didi, 15 tequilas à frente do resto do grupo, promoveu um momento ousado que não tivemos coragem de impedir. Tacou um beijo na boca da Katherine, que ficou meio atônita, perdida entre a indignação e a elegância. Acredito que ela tenha considerado tal despedida normal entre brasileiros. Se tivéssemos essa percepção, na hora, poderíamos ter aproveitado melhor a situação.

A volta na van foi uma coisa medonha. Éramos uns 25 numa van de 16. Foi o que deu. Gente em pé, no chão, no colo, berrarias, xingamentos, peidos, o diabo. Num cantinho da van, Julieta e Miriam, duas senhoras do alto escalão do turismo carioca, caladas assistiam à cena com um olhar misto de horror e compaixão. Chegando ao condomínio, onde estamos todos juntos, ao saltar da van nosso comandante Senise deu a orientação: “Vamos terminar a noite no Parea”, que é um restaurante grego maravilhoso, bem ao lado do condomínio.

Lá chegando, pedimos umas saladinhas e umas 3 ou 27 cervejas e retomamos a comemoração. Foi quando JR, de agora em diante cognominado “JR Sete Cordas, o Rei da Baixaria”, filho do Nilo, resolveu que tinha que encher de porrada um argentino que estava no bar. Até agora ninguém tem a menor idéia do por que. Depois de uns 20 minutos de ‘deixa disso’, conseguimos mais ou menos contornar a situação. Rumamos para o condomínio. Comandante Senise levou do Parea umas várias latinhas de cerveja, para terminarmos a noite com dignidade, se é que nos restava alguma.

Fomos para o nosso apartamento e estávamos rindo dos acontecimentos quando uma terceira aparição se fez. E dessa vez monstruosa, atemorizante. Didi Tequila surge na sala só de cueca e sapato, olha pra gente e pergunta: “porque eu estou sem calça?” Comandante Senise, sempre fleugmático, me perguntou: “maestro, está tudo certo?” “Ô!”. Respondi. Resolvemos que a coisa já ia longe demais e foi cada um pro seu canto. Foi quando Negão, 5 tequilas abaixo de Didi, pra terminar a noite, resolveu passar uma descompostura no mesmo, dizendo que estávamos ali a trabalho, que aquela conduta não era admissível, etc. Didi respondia que não sabia do que ele estava falando e travou-se, por uns 15 minutos, um diálogo originalíssimo, onde os dois faziam, um ao outro, perguntas que eram respondidas com outras perguntas, num movimento tanto cíclico quanto inútil. Isso aos berros e à uma da manhã. Fiz ver que nós, recém quase despejados, não estávamos em condição de correr mais riscos. Com a promessa de que no dia seguinte conversaríamos melhor sobre o assunto consegui que a coisa acalmasse. Foi quando, para terminar a noite, os dois resolveram fazer um miojinho. Os tiragostos, as toneladas de carne, maionese, lingüiças, a exuberante farofa de Katherine, o bolo de chocolate, os sorvetes, as saladas do Parea, etc, etc, não foram suficientes para eles. Estavam com fominha, tadinhos! Achei que já era mais do que hora de eu retirar meu time desse lamaçal. Fui pro meu quarto dormir.

A noite transcorreu tranqüila. Ao longe, quando muito, se podia perceber um vômito aqui, uma blasfêmia ali, enfim, nada que pudesse ameaçar nosso sossego.

E assim foi. Acreditem.

Wilson Nunes.
Johannesburg, 6 de Julho de 2010.

O ESTRAGO

Brava Gente Brasileira, tudo bem?

Hoje retomarei a questão dos preconceitos com os quais julgamos a África.
Já botei alguns mitos por terra. Um deles, já citado superficialmente em texto anterior, fala do equívoco que é considerarmos que aqui a língua oficial seja o Inglês. Aqui ninguém fala tal língua. A não ser que consideremos que alguém que, quando por nós interpelado, nos responda com um “oquê, ouraitiiiii” esteja falando inglês, o que considero muito pouco provável. Outra questão interessante é a moeda local, o Rand.
Nunca vai para o plural. É 1 Rand, 200 Rand, etc. Acredito que julguem ser moeda de tão pouco valor que não vejam sentido em considerá-la plural, seja na quantidade que for. Pode ser 1, 18, 437, 2.521, tudo é pouquinho, pra que gastar plural sem necessidade? Boa medida. Outro fator que notamos, sem o menor esforço, é o estrago causado por aqui, no passado, pelas potências colonialistas. E olha que estou em Johannesburg, a “capital financeira” da África do Sul. Numa realidade muito diferente de quase todo o resto da África. Estamos numa pequena ilha de população predominantemente branca, de altíssimo poder aquisitivo, cercada de uma imensa população predominantemente negra e inacreditavelmente miserável, em todos os sentidos. O que vemos nos jornais de TV sobre a periferia da cidade e o interior do país é impressionante. E a maneira como eles próprios percebem a si mesmos é coisa perturbadora. Ao final da partida entre África do Sul e Uruguai, que terminou com a vitória uruguaia por 3 X 0 e jogou um lago de água fria no povo, estávamos, eu e Paulo Senise, diretor do Rio Convention e o articulador do Botequim do Rio, distribuindo aos garçons da casa umas camisas do time brasileiro e o Paulo, percebendo a tristeza em seus semblantes, comentou com um deles que ainda haveria mais um jogo, os Bafana ainda teriam chance. O rapaz, um dos mais introvertidos do bar, daqueles que mal conseguem nos olhar nos olhos, apontou com o indicador para a própria cabeça e respondeu: “We don’t have understanding, capacity”. Ficamos os dois calados um tempo, perplexos com o que acabáramos de ouvir. Foi quando o Paulo respirou fundo e me perguntou: “vamos tomar um vinhozinho”? Aceitei a sugestão e ele, se dirigindo ao mesmo garçom, solicitou meia garrafa de um vinho X e duas taças. O garçom explicou que não seria possível, que o bar já estava fechado. Paulo, mais uma vez, respirou fundo e falou: ‘então nos traga uma garrafa inteira”. No que fomos prontamente atendidos.

O estrago foi maior do que podemos supor. Muito maior.

Wilson Nunes.
Johannesburg, 17 de Junho de 2010.

sábado, 3 de julho de 2010

DESPEJADOS EM JOHANNESBURG

Brava Gente Brasileira, tudo bem?

Hoje relatarei um episódio singular que nos ocorreu, e que dá dimensão de como pode ser inventivo o consórcio da cultura brasileira com a sulafricana. Foi o nosso despejo...

Primeiramente, nos alojaram num bom apartamento. Grande, confortável, com tudo que se necessita para uma vida caseira decente, como whisky, vinhos de diversas qualidades e procedências, queijo roquefort etc. A princípio, nossa amiga brasileira, que aqui mora e nos providencia tudo, inclusive o apê, disse que poderíamos usufruir do que quiséssemos nele. Que o proprietário assim havia determinado. Acredito ter sido uma cortesia, uma gentileza da parte dele. Talvez não imaginasse que cumpriríamos nossa parte com tamanha competência. Ou seja, em uma semana dilapidamos adega, freezer, todo conteúdo dos armários, tudo quanto pudéssemos mastigar ou beber. Era tudo encanto e poesia. Porém (ai, porém!), ao final de duas semanas as coisas começaram a ficar meio estranhas. Começamos a perceber que algum cambalacho permeava nossa estada.

Até que um dia, fui abordado, nos jardins do condomínio, por um senhor que se dizia o verdadeiro proprietário de nosso apartamento, querendo saber quem éramos, como ali fomos parar e até quando ficaríamos. Disse que, segundo as normas do local, não eram permitidas sublocações. Senti que a coisa estava bastante esquisita. Saí pela tangente, afirmando não estar pagando nada pelo aluguel, que éramos amigos do inquilino etc. É claro que ele não engoliu a história, bastante fraquinha mesmo, enfim...

Os dias que se sucederam foram de grande tensão para nosso suposto proprietário-na-realidade-inquilino e nossa amiga quase trambiqueira. O verdadeiro proprietário estava puto, mesmo. A cada 3 horas nossa amiga nos trazia novas explicações (cada uma mais sem sentido que a outra) para o que estava ocorrendo, e obscuras e ambíguas definições sobre nosso futuro. Demos uma de mineiro. Ficamos quietinhos, em nosso canto, esperando eles “carmá”. Depois de, em tese, nos mudarem para uns 5 locais diferentes, veio a “Solução Final”, tal e qual Hitler com seus amados judeus. Pelo que entendi, chegaram à conclusão de que, já que teríamos que sair do apartamento e ir para outro vazio, e se ao deixarmos o nosso ele mesmo se tornaria vazio, seria mais prático mudarmos para o próprio apartamento onde já estávamos. E assim foi feito. Graças ao jeitinho brasileiro-sulafricano toda a confusão se desfez, e tudo voltou a ser encanto e poesia. Até quando não sabemos...

Johannesburg, 30 de Junho de 2010.

Wilson Nunes.

APRENDENDO A TORCER

Brava Gente Brasileira, tudo bem?
Finda a memorável participação dos Guerreiros de Dunga (jogador de futebol é outra coisa, bem diferente) na África do Sul.

Pelo menos momentaneamente fez-se um clima um tanto soturno em nosso valoroso (esse sim) Botequim do Rio. O velório deve ter durado de uns 23 a 37 segundos, tempo para avistamento de garçom, para clamarmos por provisão suficiente de chope e restaurarmos nossas vidas, que há muito mais a ser feito que ficar velando mediocridade.

Mas, nesse curto espaço de tempo citado, me lembrei de uma grande lição que a África do Sul tem pra nos oferecer. Como torcer adequadamente. Em algumas partidas aqui no Botequim notei que, para eles, o mais importante é torcer, não importa muito quando, nem em que direção. Vibram intensamente com o cara e coroa que costuma abrir os jogos. Aplaudem com entusiasmo tiro de meta, ainda mais se executado com alma. Derrapadas na lama são equiparadas a cenas chaplinianas, invenções para nos divertir. Falta cobrada ao gol, mesmo passando a 30 metros do alvo, é um delírio só. Formidável!

E aí vem a parte mais incrível, que pode bem nos servir como referência para que não soframos mais com futuros deslizes de nossos, cada vez mais raros, craques. Eles comemoram os gols tanto para um time quanto para o outro! Seja qual for o resultado a torcida sempre ganha e sai comemorando, o que deixa a todos felizes e, assim, em condições de mirar seus ódios em alvos mais significativos.

Quem de nós, ainda tão arraigados aos sentimentos nem sempre tão nobres que as disputas em nós provoca, teria tal idéia? É coisa revolucionária, não há dúvida. Pra ser adotada o quanto antes, que 2014 é logo ali.

Johannesburg, 3 de Julho de 2010.
Wilson Nunes.